
"Replicas" apresentava, em 1979, um mundo de visões inspiradas em Bowie, Orwell e Philip K. Dick
A electrónica entrou nos estúdios e palcos da música pop, discretamente, em finais da década de 60. Mas só na década seguinte gerou primeiros álbuns capazes de chegar além dos pequenos nichos de atenção mais focada. A banda sonora de A Laranja Mecânica, de Walter Carlos (1971), e, pouco depois, Autobahn, dos Kraftwerk (1974), lançaram pistas. Brian Eno (dentro e fora dos Roxy Music) e David Bowie assimilaram sugestões. Contudo, só na ressaca da revolução punk a ideia de fazer pop essencialmente suportada por sintetizadores ganhou forma no Reino Unido. Bandas como The Human League, OMD, The Normal ou Cabaret Voltaire, entre outras mais, lançaram primeiros discos. Mas coube a um jovem de 21 anos, fã de Bowie, dos T-Rex e da literatura de ficção científica, o papel de transformar essa nova música num fenómeno popular. E foi ele quem, em 1979, levou pela primeira vez uma canção pop dominada por electrónicas ao primeiro lugar do top. Aconteceu com Are Friends Electric?, em Maio desse ano. Pouco depois, o LP Replicas, lançado semanas antes, conhecia igual capacidade de seduzir multidões.
Filho de um piloto de aviação, e com passado profissional que incluía uma curta temporada ao serviço de uma empresa que montava sistemas de ar condicionado, Gary Numan nasceu como Anthony James Webb em Londres, em Março de 1958. Uma guitarra oferecida nos dias de escola levou-o a formar várias bandas, a última das quais os Tubeway Army, com os quais se estreia em disco, de registo pós-punk, em 1978.
Igual a tantos outros, só depois do "tiro ao lado" do álbum de estreia ganhou confiança em levar adiante os seus sonhos e visões de uma música nova, alimentada por ideias colhidas na ficção científica, dos livros de Philip K. Dick aos de George Orwell, a filmes como À Beira do Fim, de Richard Fleisher (1973), ou Fuga no Século XXXIII, de Michael Anderson (1976). Na música, curiosamente, as suas referências apontavam não aos pioneiros alemães mas a David Bowie e Brian Eno.
Down in the Park falhou o top, mas conquistou a admiração do radialista John Peel, que com os Tubeway Army gravou uma sessão para a BBC. O entusiasmo levou a editora a aceitar gravar um álbum.
Replicas foi gravado em apenas cinco dias. E lançado poucas semanas depois, sob o nome Tubeway Army. O grupo, na verdade, estava já separado e toda a condução dos acontecimentos coube apenas a Gary Numan. Daí que edições posteriores anunciem o álbum como sendo de Numan, com a banda.
O sucesso do álbum deveu- -se em muito ao impacte das aparições televisivas de Numan. O músico fez então questão de comandar as operações. Proibiu os habituais jogos de luz e reduziu tudo a uma atmosfera robótica. Ou seja, compreendeu que a nova música exigia uma nova imagem. Não foi por acaso que se tornou então o seu primeiro ícone.(X)
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