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sábado, 12 de novembro de 2011

Livro Kulugwana homenageia mulher moçambicana com 20 histórias de dignidade e coragem


“Os homens “‘são muitas vezes ausentes’”

As "histórias de coragem e dignidade" de 20 mulheres moçambicanas anónimas protagonizam o livro Kulugwana, que a congregação das Missionárias Dominicanas do Rosário lançam hoje (sábado) em Lisboa para assinalar 50 anos de presença em Moçambique.

"São 20 histórias de mulheres que lutam com muita dignidade, com muita resiliência e coragem para sobreviverem. As irmãs queriam dar voz a estas mulheres, não só por elas, mas também para servir de exemplo a outras mulheres", contou à Lusa uma das autoras, Maria Clara Silva, que recolheu os testemunhos em 2010, quando fazia voluntariado numa das missões da congregação.

Tudo começou há três anos, quando a congregação celebrou 50 anos de trabalho missionário em Moçambique e as religiosas decidiram "homenagear algumas mulheres, extraordinárias na sua capacidade de superação e de manter o ideal vivo apesar das dificuldades que têm", como disse à Lusa a irmã Deolinda Rodrigues, da congregação em Lisboa.

"Três voluntárias que estiveram na missão concretizaram esse sonho", acrescentou.

Nas 115 páginas do livro encontram-se as histórias contadas pelas próprias mulheres e escritas por Maria Clara Silva, acompanhadas de 20 poemas, bem como 20 fotografias, da autoria de outra voluntária, a enfermeira Maria Paz Souto Moura. Uma terceira voluntária, a designer Maria Teresa Fontes, encarregou-se do design.

Professora de geografia na zona de Torres Vedras, Maria Clara Silva passou quatro meses e meio como voluntária na missão da congregação no bairro das Mahotas, a cerca de 18 quilómetros de Maputo, e foi ali que conheceu as protagonistas do livro.

"É uma zona suburbana de Maputo. Uma zona de muita pobreza onde as mulheres lutam com muita dignidade pela sobrevivência e sempre com a cabeça erguida. Foi isso que mais me impressionou", disse.

Quanto às histórias, "todas têm um traço comum: a situação de extrema pobreza e muitas vezes de solidão", porque os homens "são muitas vezes ausentes".

A irmã Deolinda concorda: "Todas têm histórias de vida muito complicadas, muito duras. São pessoas que viveram a guerra, que têm histórias de isolamento, maus-tratos ou doenças graves como o VIH sida", conta.

"A dureza é o que transparece, isso e o desejo de querer ultrapassar, a força interior que têm para ultrapassar as dificuldades", acrescenta a religiosa, que recorda que quando há três anos houve uma catástrofe, na região de Inhambane, e as pessoas ficaram sem nada "as irmãs destacavam que não viram ninguém chorar".

"A reacção geral foi: Isto aconteceu, não temos nada, mas temos a vida. Vamos recomeçar. É muito expressivo da capacidade de luta da mulher" em Moçambique, contou.

Clara destaca por seu lado as monitoras do centro social da congregação nas Mahotas, que são alfabetizadoras: "Começam analfabetas e chegam a professoras".

O livro, cujo título em ronga é um grito de exaltação e alegria, foi lançado em Julho em Moçambique e é apresentado hoje (sábado) à tarde na livraria Ler Devagar, em Lisboa. Custa 10 euros e o valor reverte para bolsas de estudo em Moçambique.

As Missionárias Dominicanas do Rosário têm cerca de 30 irmãs nas quatro missões em Moçambique. Algumas são europeias, mas a maioria é já moçambicana.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

3 de Novembro de 1987: Morre Fany Mphumo, um dos maiores trovadores de Moçambique


Por Luís Loforte

Três de Novembro de 1987, morre aos 70 anos, algures em Maputo, Fany Pfumu. Passam hoje, dia 3 de Novembro, 24 anos. O Clube dos Entas recorda a vida e a obra de um dos maiores músicos da nossa terra.

Pelos anos 50 do século passado, um jovem ronga de pequena estatura é visto a trabalhar numa mina de ouro perto da cidade de Joanesburgo. Village Mine Reef Limited assim se chamava a mina e o miúdo ali confinado não escapou à alcunha condizente com a sua extrema juventude, quase adolescente: Fanyana. Exactamente isso: Miúdo! Na verdade, o rapaz saíra de Lourenço Marques com o nome de registo de António Marriva Pfumu, Mubangu entre os seus. Entretanto, Fanyana não se fica apenas pelo sobe-e-desce da mina. Cedo começa a revelar outras habilidades. Tinha uma grande paixão pelo boxe, mas a estatura e a massa muscular não o ajudavam muito, embora todos lhe reconhecessem mobilidade e rapidez de execução fantásticas. Cantava e dançava como poucos. O reportório comportava, fundamentalmente, temas do cancioneiro popular aprendidos nos subúrbios laurentinos, mais particularmente da Mafalala e da Munhuana. Mas também de Wuloluane, hoje Beleluane, na zona da MOZAL, donde é originário. E depois começou a cantar o kwela e o Jive sul-africanos, muito em voga por aqueles anos. Toca bem a guitarra acústica mas, ao tornar-se amigo de Alexandre Jafete, um matswa de Homoíne, Inhambane, o Antoninho aprende rapidamente a tocar o Bandolim. Gravam disco atrás de disco, sendo dessa época a famosa canção Moda Xicavalo, na qual se destaca a voz de Francisco Mahecuane, que aliás nos dá a saber, ao longo do seu recital, a fonte primária do cognome de Fany: Fanyane pfumu.

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quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Mia Couto: Porque motivo a crise financeira não atingiu a indústria de armamento?

“O medo foi um dos meus primeiros mestres. Antes de ganhar confiança em celestiais criaturas, aprendi a temer monstros, fantasmas e demónios. Os anjos, quando chegaram, já era para me guardarem, servindo como agentes da segurança privada das almas. Nem sempre aqueles que me protegiam sabiam da diferença entre sentimento e realidade. Isso acontecia, por exemplo, quando me ensinavam a recear os desconhecidos. Na realidade, a maior parte da violência contra as crianças sempre foi praticada não por estranhos, mas por parentes e conhecidos. Os fantasmas que serviam na minha infância reproduziam esse velho engano de que estamos mais seguros em ambientes que reconhecemos. Os meus anjos da guarda tinham a ingenuidade de acreditar que eu estava mais protegido apenas por não me aventurar para além da fronteira da minha língua, da minha cultura, do meu território.”

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sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Eusébio Enciclopédia é lançada dia 28 de Outubro

Sabia, por exemplo, que Eusébio, antes de ser futebolista profisssional, foi arquivista numa empresa de acessórios para automóvel? E que alinhou por 6 selecções distintas? E que tem cinco irmãos e duas irmãs?

O livro dá conta de todos os títulos, todos os jogos, todos os clubes, do Benfica ao Chaves..., todos os golos a todos os adversários, todas as vitórias e todas as derrotas contra todos os adversários, todos os companheiros de equipa em todos os clubes, desde os juniores em Moçambique ao México e ao futebol «indoor».

Todas as cidades onde jogou, todos os filmes e documentários feitos sobre ele, todos os livros todos os grandes jornalistas e todas as grandes prosas todos os cromos, todas as homenagens, todas as curiosidades até ao... tremoço, centenas e centenas de entradas em centenas de páginas, milhares e milhares de nomes e de números, na primeira enciclopédia feita sobre um jogador de futebol.

Guebuza ao som de "Felizminha" de Stewart Sukuma

Presidente Guebuza de Moçambique dando uns passos de dança num almoço, dia 19, na Ponta Vermelha (Maputo) na homenagem a Samora Machel, em que tomaram parte os seus homólogos da Africa do Sul (Jacob Zuma) e do Botswana (Ian Kama)

Há dança para lá da política: Guebuza, Zuma, Mugabe e Kama mostraram o que vale ao som de Stewart


(Presidente Guebuza dando uns passos de dança com um dos seus pares/Foto MFerhat)

Os presidentes africanos e outros altos convidados que estiveram na festa do 25/o aniversário da morte do primeiro presidente de Moçambique, Samora Machel, mostraram que não só se dedicam a política para levar os destinos dos seus países a bom termo, mas também ao cultivo de virtudes que os tornam sociais.

A prova mais recente foi dada na tarde de quarta-feira no Palácio da Ponta Vermelha, residência oficial do Chefe de Estado moçambicano, Armando Guebuza, na recepção servida aos líderes africanos e outros altos convidados que se juntaram a festa, marcada pela inauguração da majestosa estátua em sua homenagem.

A recepção, que incorporou uma diversidade de pratos típicos da gastronomia moçambicana e de outros países, teve um momento cultural cujo artista de cartaz foi o músico e compositor, Stewart Sukuma, que acompanhado pela sua banda “Nkuvu”, ambientou os convidados com vários números do seu reportório discográfico.

A banda tocou e os convidados não resistiram, aos poucos foram se juntar no local defronte da tenda onde Guebuza e os seus convidados de honra estavam todos sentados.

O dono da casa levantou-se em direcção ao relvado, Jacob Zuma da África do Sul, Ian Kama do Botswana, Graça Machel e vários outros se juntaram ao momento.

A banda Nkuvu tocava e os dirigentes dançavam, trazendo um ambiente de festa típico dos convívios africanos, em que os corações de todos os convidados estão estavam revestidos de alegria imensurável, até porque o bom gosto da comida fazia muitos deles lamberem os beiços de tanto degustar.

Armando Guebuza, Jacob Zuma, Ian Kama, Graça Machel e alguns filhos do herói nacional presentes na festa dançavam e, como não podia deixar de ser, os demais convidados se fizeram a relva para mostrar os seus dotes na dança, facto que impressionou muitos e, como resposta, todos irradiavam alegria.

Se a festa dos 25 anos da trágica morte de Machel teve muitos aspectos marcantes como a visita da Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, o momento recreativo da recepção será, sem dúvida, outro grande momento de relevo registado na memória da história da efeméride.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

A justiça dos padres de Macuti: “A certeza do dever cumprido, por solidariedade com os mais desprotegidos"


(Fernando Mendes tinha 24 anos quando chegou a Moçambique. Hoje tem 64)

Por Marta Martins Silva (Correio da Manhã)

Janeiro de 1972. Prisão da Beira, Moçambique. Em duas celas contíguas, Fernando e Joaquim comunicam por pancadas secas na parede. Acabaram de ser presos pela PIDE. Não se vêem mas sabem que o outro está do lado de lá do cimento que trava a liberdade. "Estava-se no pico do Verão na Beira, a cela era uma espécie de garagem", no primeiro dia a comida foi posta no chão, sem garfo ou colher que a levasse à boca.

Por ali haviam de estar um mês, antes de serem transferidos para o centro prisional em Machava, nos arredores de Lourenço Marques. Em Portugal, no poder, está Marcello Caetano. Oliveira Salazar havia morrido dois anos antes mas o País continuava ensombrado pela ditadura. Fernando e Joaquim são os padres Mendes e Teles Sampaio, para a História conhecidos como os padres do Macúti. Os padres que desafiaram o poder em nome da paz há quase quatro décadas. Entre grades, um pensamento: poderão dois homens sozinhos, ainda que homens de fé, fazer uma revolução?

"Pela primeira vez na história de Moçambique houve padres de raça branca presos pelo regime. Uma pedrada no charco, a imprensa internacional não parava de falar do caso" – recorda hoje, aos 64 anos, Fernando Mendes, um dos protagonistas. "Naqueles dias, o sentimento que nos animava era a certeza do dever cumprido, por solidariedade com os mais desprotegidos e inocentes" – lembra o outro, Joaquim Teles Sampaio, agora com 78.

A PAZ É POSSÍVEL?

Em Novembro de 1971 Fernando e Joaquim souberam, por dois missionários espanhóis, do massacre de Mucumbura, na província de Tete. "As tropas portuguesas incendiaram e metralharam as casas (palhotas) dos negros e mataram dezenas de crianças, mulheres e idosos. Sabendo disso, era impossível calar, apesar de na cidade ‘branca’ onde exercíamos a nossa actividade – na Paróquia do Coração de Jesus do Macúti, na Beira – parecer que nada acontecia porque a censura não permitia que se falasse na guerra que acontecia ali, a escassos quilómetros" – lembra Fernando.

Não aguentaram a injustiça e, para o dia um de Janeiro de 1972, Dia Mundial da Paz, escolheram o mote: ‘A Paz é possível, mas Moçambique está em guerra’ na homilia de domingo. "Sentia revolta, gritos abafados até ao dia em que quebrei o silêncio e denunciei os massacres, perante numerosa assembleia cristã. Tinha obrigação de os denunciar e esperava que fossem uma grande trovoada" – recorda Joaquim Teles Sampaio.

"Logo nessa semana houve um burburinho, chamaram-se alguns ouvintes para contar o que tinham ouvido na homilia, e ficámos em vigilância apertada da PIDE". Oito dias depois "havia uma cerimónia de escuteiros, uma promessa dos lobitos, mas a maior solenidade centrava-se na magna reunião de todos os movimentos católicos da paróquia".

O padre Fernando, então assistente religioso dos escuteiros, impediu que a bandeira nacional entrasse no templo, porque para muitos a bandeira era símbolo de ocupação. "Foi este episódio que veio a desenrolar todo o processo, montado para difamar e condenar os padres", lembra Sampaio. A 10 de Janeiro a manchete do jornal ‘Notícias da Beira’ acicatava a revolta: "Crime contra a harmonia racial; Padres Sampaio e Fernando; Nós denunciamos" – lia-se na notícia de cinco colunas ilustrada com cinco fotos tipo passe do padre Joaquim.

O artigo era assinado por CA, conselho de administração, embora a autoria fosse atribuída ao engenheiro Jorge Jardim (pai de Cinha Jardim), administrador. "Essa noite, como reacção à notícia houve um apedrejamento contra a nossa casa, se lá estivéssemos tínhamos sido linchados", afirma Fernando. Estavam longe, em Vila Perry, a mais de uma centena de quilómetros da Beira, num encontro religioso. Foi lá que foram presos, levados pela PIDE para a prisão.

O ano "que passei na prisão foi, por estranho que pareça, o ano mais feliz da minha vida, embora tenha sofrido muito. Mas ali o meu sofrer teve, como nunca, uma razão de ser. É lutando que se vive e é a lutar que se morre" – diz Sampaio. Um ano e três meses depois foram julgados.

"Cada dia a mais na prisão era um prejuízo para o governo. A sentença para o Sampaio foi de dois anos de prisão, mas como tinha passado um ano ficou com pena suspensa. Para mim foi sete meses, dado como cumprido", lembra Fernando. Regressaram a Portugal em Março de 1973 em aviões diferentes por medo de represálias. Depois disso, Sampaio foi pároco da Reboleira, na Amadora, leccionou na escola secundária e colaborou em várias outras paróquias.

Regressou há seis anos a Manteigas, onde iniciou a sua carreira sacerdotal. Fernando mora em Braga, na terra onde nasceu. Largou a batina da Igreja em 1974 por desilusões várias com a instituição. Licenciou-se em História, casou com uma catequista e teve dois filhos. Já é avô. O tempo passa mas a História está escrita: Fernando e Sampaio serão sempre os padres do Macúti.

JULGADOS NO TRIBUNAL MILITAR

Na prisão da Beira, onde estiveram o primeiro mês, não foram torturados "por serem brancos e padres" mas as condições eram nulas. "Era uma autêntica frigideira onde as minhas costas se esfolaram", recorda Sampaio, que arranjou "o cotinho de um lápis com que escrevia recados em papel higiénico para Fernando, enviados pelo rapaz da limpeza que se solidarizou" com a história.

Depois do inferno na prisão da Beira, atormentou-os a prisão de Lourenço Marques, onde estavam detidos dois mil presos políticos em nove pavilhões. O caso dos padres do Macúti é o único caso conhecido de dois elementos do clero secular terem sido julgados por um tribunal militar.

Jovens com carros e motos 4x4 estão a ameaçar seriamente a tartaruga marinha na praia de Bilene


As autoridades administrativas da Praia de Bilene estão preocupadas com a frequente ocorrência de desmandos protagonizados por alguns turistas, através do uso de veículos e motos de tracção às quatro rodas nos locais onde, habitualmente, as tartarugas marinhas criam seus ninhos.

Segundo Domingos Matabel, chefe do posto administrativo da Praia de Bilene, em entrevistado recentemente pelo Jornal Notícias, a movimentação desordenada de veículos, para além de destruir os ninhos impede, igualmente, o acesso ao mar das crias recém-nascidas.

Outros factores que interferem, de alguma maneira, para a intranquilidade daquelas espécies marinhas protegidas tem a ver com o excesso de iluminação nocturna e a poluição sonora que, nalgumas vezes, pode interferir na desova das tartarugas.

“Temos estado a trabalhar, arduamente, com as lideranças comunitárias, assim como com a classe empresarial com interesses no Bilene, para que, em conjunto, possamos fazer algo para a protecção destas espécies de valor turístico incomensurável, ameaçadas de extinção. Com efeito, e no âmbito dessa mesma parceria, a Praia de Bilene tem estado a receber uma grande contribuição por parte do Centro de Desenvolvimento das Zonas Costeiras, que com alguma regularidade tem estado a prestar monitoria, designadamente na protecção do ecossistema”, disse Matabel ao matutino Notícias.

No quadro dessa cooperação com os diversos intervenientes foi possível a salvação, no início do ano em curso, de duas tartarugas apanhadas junto à orla marítima, das quais uma com problemas de fadiga e outra com ferimentos, que depois do tratamento e repouso foram posteriormente devolvidas ao mar.

Segundo o chefe do posto administrativo de Bilene, a presença de um posto de guarnição na zona da Lagoa Uembje, destinado à protecção das tartarugas marinhas, tem sido determinante para que aquelas espécies se sintam seguras e se possam reproduzir num ambiente de tranquilidade.

Refira-se que a existência da Lagoa Uembje, com águas brandas, assim como de uma praia de águas marítimas com ondas que formam um movimento titubeante e maravilhoso, aliado à presença de um imponente miradouro para observação de tartarugas marinhas, bem como a preferência daquele local para a prática da pesca desportiva e outras modalidades náuticas, constituem importantes atractivos que levam, anualmente, ao Bilene, milhares de turistas para se deliciarem daquela beleza ímpar da natureza.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Com artistas africanos e europeus: Maputo acolhe mais uma edição do concerto cultural UMOJA


A Capital moçambicana, Maputo, vai acolher entre os dias 28 e 29 de Outubro em curso a VI edição do mega concerto cultural “UMOJA”, no qual vão desfilar vários artistas nacionais e de outros países da África e Europa.

O UMOJA é um festival cultural que se realiza numa periodicidade anual e de forma rotativa entre os países envolvidos no projecto, mas desta feita acontece pela quinta vez consecutiva na Praça da independência, na cidade de Maputo, por oferecer um ambiente único e acolhedor.

Manuel Pita, do Ministério da Cultura, disse hoje, em conferencia de imprensa, que a edição deste ano tem a particularidade de acontecer em pleno ano Samora Machel e num local onde foi erguido uma estátua imortalizando o fundador do Estado moçambicano.

Este ano um dos fortes atractivos do festival, que normalmente é caracterizado por música, dança e circo, é uma exposição de obras produzidas no país e que retratam a vida e obra de Samora Machel.

Segundo Pita, Samora Machel sempre se bateu pela valorização da cultura e da arte ao ponto de, em vida, ter sempre afirmado que “A cultura é o sol que Nunca desce e é factor de identidade e desenvolvimento dos povos”.

Paralelamente, os organizadores deste evento atribuem, no decurso do festival, um prémio aos artistas que se evidenciam na promocao da cultura e da arte, em Africa.

Moçambicanos como o malogrado artista plástico Malangatana Valente Nguenha, um dos patronos deste festival em Moçambique, já ganharam o prémio UMOJA.

Por seu turno, a Embaixadora do Reino da Noruega, Tove Wesrberg, disse que o seu país apoia o UMOJA por constituir uma oportunidade para a promoção e intercâmbio cultural entre os povos de diferentes cantos do planeta

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Imagens de Moçambique no Concurso da National Geographic 2011



O concurso mundial de fotografias National Geographic Photo Contest 2011 já começou a selecção dos concorrentes. Na edição anterior foram 16 mil fotos submetidas por fotógrafos de 130 países diferentes. Em 2011 os concorrentes puderam inscrever as suas fotos em três categorias: pessoas, lugares e natureza. As imagens serão julgadas pelos fotógrafos da National Geographic Tim Laman, Amy Toensing e Peter Essick e algumas das fotos podem ser vistas pelo site do concurso: http://ngm.nationalgeographic.com/ngm/photo-contest/. Os vencedores serão divulgados no dia 15 de dezembro.

As imagens representativas de Moçambique são de autoria de Alina Dumitrache (crianças de Bilibiza, Cabo Delgado) e a que se vê acima, de autoria de Ismael Miquidade, mostra crianças a nadar na Praia das Chocas-Mar, na província de Nampula. Ambas concorrem para a categoria “Pessoas”.

sábado, 8 de outubro de 2011

Visão alternativa do Congo colocou moçambicano Mauro Pinto na final do BES PHOTO 2012

Com um trabalho que apresenta uma visão alternativa do Congo, o moçambicano Mauro Pinto, que recusa "rotular" as suas próprias criações, foi um dos quatro seleccionados para a final do prémio BES Photo 2012, anunciou hoje (sábado) a Agência Lusa.

"Maputo - Luanda - Lubumbashi" é o título do trabalho de Mauro Pinto apurado pelo júri do BES Photo 2012, um projecto do fotógrafo que visita as capitais de Moçambique, Angola e Congo.

Inicialmente, o trabalho de Mauro Pinto estava relacionado com uma pesquisa individual sobre antigas rotas de escravos, mas, no Congo, decidiu recolher imagens que apresentassem visões alternativas, fotografias do país que o mundo não está acostumado a ver.

"Eu sempre que via fotografias do Congo, observava uma coisa má, agressiva, de guerra. Não é possível que um país como aquele só tenha isto. E então fiz este projecto, 'Lubumbachi: Interiores-Exteriores', com o que me tocou de uma outra maneira", disse Mauro Pinto à agência Lusa.

Visivelmente satisfeito com a nomeação para a final do concurso fotográfico, "que tem grandes nomes" seleccionados, Mauro recusa "rotular" as suas próprias criações.

"Os rótulos são os outros que nos colocam. Eu não posso dizer o que eu sou. Simplesmente sei dizer que gosto de fotografar e vou fotografar. Se é jornalismo, se é artístico, se é documental, cabe aos outros dizer isso", comentou.

Através de Mauro Pinto, Moçambique estará pelo segundo ano consecutivo representado na final deste galardão da área da fotografia, que atribui 40 mil euros ao vencedor.

Os outros finalistas seleccionados para o Prémio BES Photo são o português Duarte Amaral, a brasileira Rosangella Rennó e o colectivo brasileiro Cia de Foto.

Os quatro vão defrontar-se numa exposição individual, financiada pelo galardão, a ter lugar em Março de 2012 no Museu Colecção Berardo, em Lisboa, onde será apurado o derradeiro vencedor do concurso.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Brana expõe “Pontos de Vista” ao lado de Gonçalo Mabunda e Mauro Pinto

A conhecida pintora servia Branislava Stojanovic, artisticamente conhecida por "Brana", volta a expor no Maputo, mais concretamente no Centro Cultural Brasil-Moçambique.

Há sensivelmente dois anos e meio a residir em Moçambique, Brana traz, agora, uma marca ainda mais evoluída comparativamente às suas anteriores exibições ao expor um conjunto de obras de arte em “Pontos de Vista”, onde se apresenta ao lado do escultor Gonçalo Mabunda e do fotógrafo Mauro Pinto.

Igual ao título que leva a presente mostra, cuja inauguração teve lugar ontem, esta um verdadeiro momento de demonstração dos diferentes pontos de vista que cada um dos três expositores têm sobre o dia-a-dia que hoje se vive. “Esta colectiva junta três formas de expressão artística, designadamente a pintura, a escultura e a fotografia. É essa diversidade de formas de manifestação artística que vai dar lugar a diferentes pontos de vista”, considerou a Brana.

No seu caso concreto, a artista plástica Brana, que falava recentemente à nossa reportagem, disse que a grande particularidade que caracteriza a sua arte tem a ver com o facto de ter introduzido o uso da capulana como tela, substituindo assim a tela tradicional.

A sua arte passou por várias fases e ela mesma lembra que começou a pintar de maneira clássica tendo, somente mais tarde, começado a mudar aos poucos para um formato cada vez mais espontâneo e original.

Nasceu na Sérvia e viveu na Itália, onde adquiriu diversas formas artísticas de expressar os seus sentimentos, emoções e pensamentos. Mas agora, que vive em Moçambique há sensivelmente dois anos e meio, a sua arte adquiriu novas formas, resultantes das influências das cores, cheiros e sabores locais. “É natural que a minha arte tenha influências de outros países por onde passei, mas sinto que ganhei mais ainda mais ao introduzir a capulana, sobretudo na estética, na temática e no pensamento”, descreveu a artista.

Enquanto falava da sua forma de se manifestar nas artes plásticas, Brana ilustrava com os conteúdos de cada uma das obras que estavam no seu atelier no momento em que a visitamos. Em “Encantamento” – onde se vê uma mulher negra a abraçar um antílope depois de descobrir nele as características de um homem –, está reflectida a sua paixão pelas histórias mágico-tradicionais que fazem parte do dia-a-dia de muitos moçambicanos, retratos de um lugar comum onde ninguém acredita que os homens são capazes de se transmutar e virarem animais.

Para além de histórias do universo mágico-tradicional, Brana aborda problemas relacionados com o racismo, como, por exemplo, em “Arco Íris”, onde um homem branco e uma mulher negra se descobrem. “Não que seja uma história pessoalmente minha, mas faz parte do nosso quotidiano, contrariando algumas manifestações de racismo que ainda existem tanto de brancos para negros quanto de negros para brancos”, como explicou.

Os temas que abordam são satisfatoriamente diversificados, a avaliar pelo facto de os temas políticos, que também não escapam ao seu olhar crítico. É o que se pode atestar em “Óculos para não ver”. “São óculos para cegar as pessoas. Não cegá-las literalmente, mas fazê-las verem outras coisas que lhes entretém no lugar de encararem os problemas reais que hoje existem, como a pobreza e a indigência”, elucidou Brana, que já participou em diversas exposições individuais e colectivas.

Fonte: jornalnoticias.co.mz

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

No Kruger Park: Veterinários serram chifres de rinocerontes para evitar que sejam caçados

(Rinocerontes com chifres serrados no Parque Kruger, na África do Sul (Foto: Ilya Kachaev/REUTERS)

Ver rinocerontes com chifres deformados virou uma cena comum no Parque Nacional Kruger, na África do Sul. A medida extrema foi uma decisão dos veterinários do parque para tentar salvar a espécie da extinção.

Os rinocerontes são constantemente caçados por causa dos seus chifres. Os invasores arriscam-se na área onde vivem leões e tigres para matar rinocerontes. Centenas desses animais são mortos, o que tem causado uma crise na protecção da espécie, considerada em risco de extinção pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUNC). A caça, que antes ocorria de forma primitiva, hoje acontece com armamentos militares.

Os animais são mortos para abastecer o comércio ilegal de “remédios” chineses. Os orientais acreditam que os chifres dos rinocerontes têm poderes afrodisíacos, e no Vietnam acredita-se que os chifres podem curar o cancro. Não há nenhuma evidência científica de que os chifres – feitos de queratina, o mesmo material que reveste as unhas e o cabelo – tenham alguma propriedade medicinal.

Desde abril, os soldados do exército regular sul-africano estão mobilizados ao longo da fronteira com Moçambique para tentar salvar a espécie da extinção. Em março, mais de 40 rinocerontes foram mortos. Os caçadores abandonaram as tácticas primitivas e passaram a invadir o parque com armas militares e óculos de visão nocturna.

Com cerca de 20 mil quilômetros quadrados, a região é um dos últimos refúgios dos rinocerontes brancos e pretos na natureza.

Existem na área cerca de 1.900 rinocerontes brancos e mais de 200 rinocerontes pretos.

Situado entre a capital de Moçambique, Maputo e a velha cidade mineira da província de Mpumalanga, no noroeste da África do Sul, o Kruger Park foi criado em 1926 e é uma das mais antigas reservas naturais do mundo e uma das mais importantes de África.

O Kruger é considerado uma dos dez parques naturais mais importantes do mundo. Vivem na região mais de 500 espécies de aves, 112 de répteis e 150 de mamíferos. O local é um refúgio para animais como leão, leopardo, búfalo, elefante e rinoceronte.

Crime organizado pode estar por detrás dos caçadores furtivos na reserva Safaris de Moçambique

(Existem cerca de 100 mil Impalas na reserva Safaris de Moçambique, em Tete)

Centenas de animais selvagens, nomeadamente elefantes da reserva Safaris de Moçambique, em Tete, centro, podem estar a deslocar-se para o Zimbabwe, devido à ameaça de caçadores furtivos, denunciou hoje (quarta-feira) à Lusa fonte do preendimento.

Segundo o responsável pela área técnica e de segurança da reserva Safaris de Moçambique, Paulo Evants, há dias um grupo de caçadores furtivos moçambicanos e estrangeiros invadiu o local para recuperar o armamento usado no abate ilegal de animais dentro da estância turística e que havia sido apreendido pelos proprietários do empreendimento.

A tentativa de recuperação das armas não teve sucesso, porque as mesmas já tinham sido entregues à polícia do distrito de Magoe, disse Paulo Evants.

Em declarações à Lusa, o responsável da reserva afirmou que "a fauna em Tete está em grande risco" e admitiu a possibilidade de alguns envolvidos na caça furtiva serem pessoas próximas de "dirigentes conhecidos" da região.

"Aquilo é crime organizado", afirmou Paulo Evants, assinalando que, só este ano, "mais de 30 elefantes foram abatidos".

A reserva Safaris de Moçambique, localizado na chamada "garganta" do rio Zambeze, na província de Tete, na fronteira com o Zimbabwe e Zâmbia, é rica em espécies florestais e animais, mas é também considerada um dos locais que produz os melhores troféus de caça do continente africano.

De acordo com estimativas dos proprietários do empreendimento, existem na reserva cerca de 100 mil impalas, 15 mil búfalos, oito mil elefantes, além de zebras, leões e leopardos, que têm sido alvo de caçadores furtivos.

"Alguns destes animais estão sem comer por causa das queimadas. Ao verem-se perseguidos podem emigrar para lá (Zimbabwe). Estão em perigo", alertou Paulo Evants.

Falando à Lusa, o director da ordem e segurança pública da província de Tete, Ussufo Omar, disse que as autoridades policiais enviaram um contingente para a região para reverter a situação que, considerou "estar sob controlo" das autoridades.

"Já há controlo, estamos seguros com o reforço policial. As medidas de segurança estão sob controlo", pelo que "o turismo está a decorrer normalmente", assegurou à Lusa Ussufo Omar.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Livro investiga porque “as comunidades muçulmanas não passaram para para o lado da Frelimo” durante a guerra colonial

(Mesquita dos “Monhés” na ex-Lourenço Marques, no ano de 1929/Foto de álbuns de Santos Rufino)

Os esforços que a administração portuguesa desenvolveu em Moçambique entre 1966 e 1973 para alinhar as comunidades muçulmanas com o lado português evitou que a guerra "tivesse corrido pior", afirma o principal responsável dessa estratégia.

Fernando Amaro Monteiro foi o principal responsável pela concepção e condução do programa destinado à política islâmica que o poder colonial português levou a cabo em Moçambique para atrair e alinhar as comunidades muçulmanas, e cuja história agora é retratada no livro "Moçambique: Memória Falada do Islão e da Guerra", que hoje é apresentado em Lisboa.

O trabalho é composto por uma série de entrevistas que AbdoolKarim Vakil, professor no King's College de Londres, fez a Fernando Amaro Monteiro em 2004, e, que, entre outros, descrevem detalhadamente os múltiplos esforços que o poder constituído desenvolveu durante a guerra colonial em Moçambique para evitar que as comunidades muçulmanas passassem para o lado da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).

A política adoptada para com o Islão em Moçambique, precisa Amaro Monteiro, foi iniciada em 1965-66, tendo ganhado principal relevo a partir de 1968 com a chegada ao território de Baltazar Rebelo de Sousa como governador-geral, o qual abraçara todas as principais linhas de orientação do chamado "Plano de Acção Psicológico".

De acordo com Amaro Monteiro, a acção de Rebelo de Sousa - que tinha um "talento de relações públicas e uma capacidade de comunicação espantosos" - foi preponderante para o estabelecimento desse diálogo.

"Num contexto de guerra, este plano - através do qual se procurou o estabelecimento de um diálogo, de um entendimento e de uma interlocução com os muçulmanos no país (na altura cerca de 1.2 milhões de pessoas) - foi fundamental", visto que várias áreas estratégicas do território eram ocupados por estas comunidades, explica Amaro Monteiro.

Se esse plano de aproximação - que teve "grande sucesso mas que devia ter sido implementado mais cedo" - não tivesse existido, garante, essas zonas estratégicos teriam caído nas mãos da FRELIMO e ali "as coisas no terreno teriam corrido pior".

"Não vamos dizer que se isto tivesse sido feito antes tínhamos ganhado a guerra porque termos perdido a guerra globalmente como país foi uma coisa que aconteceu por força de uma situação histórica especial e de uma conjuntura internacional muito própria", realça Monteiro, que no período retratado no livro era adjunto dos Serviços de Centralização e Coordenação de Informações de Moçambique e consultor dos Governadores-gerais daquele território (1970- 1974).

"Não era o conhecimento desta massa [da comunidade muçulmana] antecipado e devidamente accionada que faria com que tivéssemos ganhado a guerra", reitera, salientando, contudo, que se essa massa tivesse sido accionada antes o "rendimento que ela deu a favor da administração portuguesa podia ter sido muito maior e teria começado muito antes".

O livro, da autoria de Abdoolkarim Vakil, Fernando Amaro Monteiro e Mário Artur Machaqueiro e editado pela Almedina, fornece informações sobre diversos protagonistas centrais do período histórico referido e retrata também a postura da hierarquia católica perante a religião islâmica em Moçambique as comunidades muçulmanas.

(Lusa)

Salimo Muhamad nos estúdios da RM: Afro, Rock, Blues, Jazz e Makwaela para os fãs

Por Edmundo Galiza Matos

Já lá vão quase quinze anos que Salimo Muhamad, não entrava nos estúdios na Rádio Moçambique para gravar. Nesta terça-feira, encontramo-lo a trabalhar, junto com o baterista Paito Tcheco, nos últimos acertos de um único tema dos muitos que possui, e cujo lançamento ainda não tem data acertada.

“Papaito Na Mamaita”, assim se chama a música, uma exaltação à importância da educação no seio do núcleo familiar, numa altura em que “muitos valores nobres que devem caracterizar uma sociedade civilizada” estão a ser relegados a favor de um modo de ser e estar baseado num consumismo desenfreado.

“Há muita baldice no seio da família, o que leva a que uma significativa parte da nossa sociedade esteja doente, carente de valores de respeito pelo outro e pelo alheio”, disse Salimo Muhamad, quando interrogado sobre a escolha desta temática para esta música ainda em fase de misturas.

Dono de temas emblemáticos na canção ligeira moçambicana como “Sambroeira Fandango”, “Bilibiza” e “Xantima Hi Bohlela”, Simeão Mazuze (seu nome verdadeiro) confessou que possui um reportório que daria para a edição de uma obra completa em CD, o que não vai acontecer tão já por falta de meios financeiros.

Aos 63 anos de idade, reconhece que começa a ficar tarde para a produção de um disco dos seus originais, sublinhando que os apelos dos fãs nesse sentido esbarram com o crónico problema da música moçambicana: dinheiro, essa mola propulsora que não é accionada por quem é capaz. Por outras palavras, ninguêm neste país investe na música. “Papaito Na Mamaita” está a ser gravado porque o editor musical da Rádio Moçambique, Domingos Macamo, entendeu que o artista estava há bastante tempo sem “Uma novidade”.

Naquele seu riso característico, o músico ainda hesitou quando quisemos saber o que teriamos em termos de género neste “Papaito Na Mamaita”, confidenciando-nos que se trata de uma mistura de Afro, Rock, Blues, Jazz e Makwaela, ou seja, “tudo o eu bebi desde a minha infância até no meu tempo de Bilibiza e Nampula".

Com Salimo Muhamad gravaram esta música Sima (Bateria), Paito Tcheco (Percursão), Chabuca (Viola Baixo), Carlos Fenias (Viola Solo), Ercílio Jordão (Teclados) e Belita (Coros).

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

“Não Podemos Ver o Vento”: Romance de Clara Pinto Correia investiga a guerra colonial em Moçambique

«Não Podemos Ver o Vento», é o novo romance de Clara Pinto Correia. «Foi, sem sombra de dúvida, o trabalho de campo mais cansativo que alguma vez me meti por amor a um romance», afirmou a autora.

«Mariana, uma psicóloga ruiva de coração ardente e determinação férrea, está na casa dos trinta quando conhece Guilherme. Mãe de duas gémeas demasiado bonitas, atrevidas e curiosas para seu próprio bem, Mariana começa a frequentar o Solar de Turismo de Habitação que Guilherme dirige na Serra do Barroso para preencher de forma criativa e pedagógica os tempos livres das filhas.

Estabelece rapidamente uma grande amizade com o proprietário e à medida que essa relação se vai estreitando começam a emergir os temas que lançarão a psicóloga na sua investigação sem retorno: a Guerra Colonial em Moçambique, a formação dos Grupos Especiais e dos Grupos Especiais Pára-Quedistas, as suas incríveis missões-relâmpago de contraguerrilha, o uso de estupefacientes fornecidos pelo próprio Exército Português, e outros segredos.

«Não Podemos Ver o Vento» é um puzzle em que as peças vão encaixando para revelar aspectos imprevistos dos abismos da alma humana e histórias verdadeiras de um dos segredos mais bem guardados da Guerra. A última peça do puzzle, no entanto, ao revelar o quadro na sua totalidade, também o modifica por completo: afinal havia ainda mais um segredo, o mais impressionante de todos, e desse nem Guilherme falou nem Mariana suspeitou. E não é que não tenha estado sempre à vista»

A reabilitação da esperança – Mia Couto

Por Paulo Miguez (*)

Mia Couto, escritor moçambicano e um dos expoentes contemporâneos da literatura de língua portuguesa passou mais uma vez pela Bahia. Esteve entre nós, na primeira semana de agosto, marcando presença no VII ENECULT o cada vez mais importante Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura promovido pelo Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura da Universidade Federal da Bahia e que congrega estudiosos de diversos campos do conhecimento, do Brasil e do exterior, interessados nas temáticas culturais. Além das muitas entrevistas que concedeu, foi o palestrante do Conversas Plugadas, projecto da Secretaria de Cultura do Estado que acabou, nesta sua edição, compondo a programação de encerramento do XXI Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, este ano realizado em

Salvador.

No ENECULT, Mia, com um texto que baptizou com título "O homem que casou com a Bahia

", tratou da relação entre cultura e desenvolvimento. "Culturas e desenvolvimentos", consertou ele, afirmando a sua compreensão de que ambas as palavras só fazem sentido se pronunciadas no plural - palavras que, como "cultura", são tão complexas que, relatou, são intraduzíveis em muitas das mais de duas dezenas de línguas nacionais faladas em Moçambique.

No Conversas Plugadas, Mia deliciou-nos com a conferência "Um Mar Vivo: como Jorge é Amado em África", propondo uma leitura africana da obra de Jorge Amado, do impacto da obra do escritor baiano na literatura africana de língua portuguesa - feliz coincidência, a fala de Mia Couto aconteceu exactamente no dia 10 de agosto, data em que Jorge Amado completaria 99 anos.

Em ambas as conferências, uma fala mansa, cuidadosa, preciosamente poética. Em ambas, Mia disse-nos da sua familiaridade com a cena brasileira, da sensação de sentir-se em casa estando na Bahia

. Mas disse-nos, especialmente do que considera ser uma tarefa fundamental dos tempos que correm, a reabilitação da esperança.

Esperança. A ela tem se dedicado Mia no seu ofício de escritor - e de biólogo. Mia recusa-se a ser um escritor de tempo integral. Continua a trabalhar como

biólogo, na área da ecologia. Aliás, um casamento mais que perfeito. O biólogo ecologista, preocupado com as questões ambientais, e o escritor, atento ao fascinante e diverso universo das culturas moçambicanas que servem de alimento seminal para as suas palavras-poema.

Esperança de que a compreensão da cultura ultrapasse os factos visíveis e alcance os gestos silenciosos que dão sentido à vida das gentes.

Esperança, a mesma esperança que os livros de Jorge Amado despertaram nos escritores africanos de língua portuguesa que, em luta contra o colonialismo português em África, aprenderam a ver em Jorge a possibilidade de fazer do português uma língua também deles, africanos.

Vivi em Moçambique durante 11 anos.

Entre 1982 e 1993. Lá conheci Mia. Lá, ao longo destes 11 anos, quase todos marcados por uma guerra odiosa, tive o privilégio de integrar, com Mia e com muitos outros, moçambicanos e estrangeiros "cafrealizados" como eu, uma geração que bem pode ser chamada de "geração esperança".

Ficaram para trás as ilusões da revolução que amávamos tanto.

Nesse sentido, somos hoje, esta geração, tomando de empréstimo a expressão com que designávamos os guerrilheiros que fizeram a Luta Armada de Libertação Nacional em Moçambique, a geração dos (novos) "velhos combatentes". Mas não abandonamos a mania de sonhar, de ter esperança.

As palavras de Mia, os seus livros, garantem-nos, tanto lá quanto aqui, cestos de sonhos, rios de esperança.

Khanimambo (obrigado) Mia.

Breve nota biográfica: M

ia Couto nasceu António Emilio Leite Couto a 5 de julho de 1955 na cidade da Beira, Província de Sofala, em Moçambique. Filho de uma família de emigrantes portugueses, Mia publicou os primeiros poemas no "Notícias da Beira", com 14 anos. Em 1972, deixou a Beira e partiu para Lourenço Marques, atual Maputo, para estudar Medicina. Com a independência de Moçambique, em 1975, ingressou no jornalismo. Dirigiu a Agência de Informação de Moçambique (AIM) e, posteriormente, a revista semanal "Tempo" e o jornal "Notícias". Tendo abandonado os estudos de medicina, formou-se em 1985 em Biologia pela Universidade Eduardo Mondlane. Durante a década de 1980 publicou seus primeiros trabalhos. "Raiz de Orvalho" (1983), "Vozes anoitecidas" (1986) e "Cada Homem é uma Raça" (1990), o primeiro, um livro de poesias, os dois outros, de contos. Em 1992, publicou seu primeiro romance, "Terra Sonâmbula". Na sequência publica "Estórias Abensonhadas" (1994), "A Varanda do Frangipani" (1996), "Vinte e Zinco" (1999), "Contos do Nascer da Terra" (1997), "Mar me quer" (2000), "Na Berma de Nenhuma Estrada e outros contos" (2001), "O Gato e o Escuro" (2001), "O Último Voo do Flamingo" (2000), "Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra" (2002), "O Fio das Missangas" (2004). Tendo ganho vários prêmios literários, Mia Couto é hoje um dos escritores africanos mais traduzidos e suas obras estão publicadas em mais de 20 países. No Brasil, acaba de lançar um livro de ensaios intitulado "E se Obama fosse africano? e outras interinvenções" (Companhia das Letras, 2011).

(*) Paulo Miguez é doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas. Atualmente é professor do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da UFBA e coordena o Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade (UFBA). Foi assessor do ex-ministro da Cultura Gilberto Gil e Secretário de Políticas Culturais do Ministério da Cultura entre 2003 e 2005.

Entrevista: Samora Machel conseguiu fazer Fidel Castro cantar – Ruy Guerra

(Na imagem, Ruy Guerra entre o fotográfo (Esq) Daniel Andrade Simões e o escultor Malangatana, nos primeiros anos após a independência de Moçambique)

RUY Guerra , autor do filme “Mueda, Memória Massacre” é homenageado foi homenageado esta quarta-feira em Maputo. Uma homenagem merecida, daquele que é considerado o percursor do cinema nacional, agora a residir no Brasil, país que elegeu como sua segunda pátria, desde 1958. A iniciativa de homenageá-lo foi da Universidade Técnica de Mocambique (UDM), em parceria com o DOCKANEMA, e este foi um pretexto para uma longa e interessante conversa com o autor, que aqui reproduzimos com a devida vênia. Ela foi publicada no Caderno Cultural do jornal “Notícias” de Maputo

Porque abandonou Moçambique?

Naquela época havia aqueles movimentos da juventude contra o salazarismo, nomeadamente o movimento de unidade democrática, quando a Polícia Internacional de Defesa do Estado (PIDE) foi instalada aqui em Moçambique nós fomos perseguidos porque nós escrevíamos, era um grupo que escrevia e que faziam parte Rui Knopfli, João Mendes, Noémia de Sousa, era um grupo com forte expressão cultural e que era alvo de perseguições enquadradas numa lei sobre qualquer coisa como segurança nacional. O caso mais grave é que nós éramos menores pouco podiam fazer contra nós. Lembro-me que João Mendes foi deportado na época para Angola e depois para a Ilha do Sal, ele era maior tinha entre 27 e 28 anos e nós tínhamos entre 17 e 18 anos.

Consta-me que apesar de ser menor foi preso na sequência dessas perseguições que eram alvos da PIDE. Confirma?

Não chegamos a ficar presos, éramos menores, estudantes do liceu. Também havia aquele estatuto colonial e havia contradições porque o próprio do governo da época não queria que a PIDE se instala-se aqui. Portanto, eles não agiam com muita força, foi um passo gradual que eles estavam usando sobre o aspecto da repreensão. Então a gente era detida e volta e meia lá no liceu escrevíamos um artigo e ia lá alguém prender um de nós. O reitor nunca deixava o jeep da PIDE entrar na escola e assim conseguíamos fugir. Nunca fiquei preso mesmo.

Que ideais defendiam na época até porque ainda eram menores?

Basicamente era a independência de Moçambique. Era o grande mito do momento. Não era uma questão territorial, mas sim uma questão do salazarismo. Era uma luta contra a ditadura do Salazar. O nosso grande ideal era esse, mas também por causa da questão racista. O racismo era muito forte e presente no quotidiano. Nos machibombos tinha um banco atrás só para os pretos, mas se um branco, mesmo com o machibombo completamente vazio fosse sentar lá, os pretos já não podiam entrar no carro. Era muito violento. Lembro me que o Scala era o único cinema que admitia a entrada de pretos, mas tinha lá no fundo uma espécie de uma jaula. Essas coisas que criavam revolta porque a nossa geração não era uma geração racista. Eu, por exemplo, tinha tido uma “babá negra” que me criou, e que para mim era a minha mãe, era mais que minha mãe, e que morreu a poucos anos. Não compreendia quando eu procurava beija-la e ela fugia. Mas tudo porque um branco não podia beijar um preto e, eu, ainda garotinho comecei a questionar essas coisas. A minha entrada na política foi por causa da insensibilidade em relação a isso. Não podia me realizar com a minha mãe (babá). Fui crescendo e fui ganhando consciência sobre esta questão racista.

Deixa Moçambique e vai a Portugal, mas lá também é detido logo à sua chegada. Essa será a razão que fez com que não ficasses em Portugal passando para França?

Não ia para Portugal, o meu destino sempre foi França. Eu estava de passagem, coincidiu que o meu pai estava lá, ia ficar uns dias e depois viajava para França. Tinha feito o sétimo ano de liceu, mas não me interessava nada das universidades portuguesas, mas acabei ficando quase um ano em Portugal porque o nível que fiz em Moçambique tinha uma disciplina a menos. Faltava a disciplina de história para poder ter o diploma do sétimo ano que me dava créditos para ingressar na universidade na França. Entretanto, a minha chegada a Portugal fui preso pela PIDE, na verdade foi detenção de 24 horas, foram me buscar no barco em que viajei de Moçambique.

Se nenhuma universidade lhe interessava em Portugal, o que lhe interessava na França?

O cinema.

Quer dizer que saiu de Moçambique com esse objectivo. E onde foi buscar esse “bichinho” do cinema?

Pois é, fui buscar esse “bichinho” um pouco por acaso. Porque na realidade a minha meta era de ser escritor. O cinema foi aparecendo assim, era apaixonado de cinema, mas não tinha intenção. Aqui em Moçambique tinha uns amigos que tinham uma câmara de filmar de oito milímetros com a qual aprendi a filmar e depois comecei a fazer crítica cinematográfica. Havia na época o “Itinerário” que era um jornal de esquerda onde comecei a fazer crítica. Aliás esse era dos motivos da perseguição pela PIDE. Foi ganhando gosto pelo cinema e depois como não há nenhuma universidade de romancista, o jornalismo nunca foi uma vocação minha, sou muito preguiçoso para ser jornalista, optei pelo cinema que já era uma paixão.

Quero escrever um livro que fica em pé

Sei que escreve, inclusive letras para música, mas a minha questão é: esse sonho de ser escritor não lhe provoca nenhuma frustração?

Não. Eu não renunciei ser escritor. Tenho uma brincadeira que digo que agora estou a começar a escrever mais. Escrevi para o teatro, escrevi contos, crónicas, trabalhei cinco anos escrevendo uma crónica por semana, mas isso para mim não é ser escritor. O escritor é aquele que escreve um livro que, como alguém uma vez disse e achei interessante, um livro que fica em pé. Eu quero escrever um livro que fica em pé. Brincando eu digo que vou morrer aos 117 anos.

Neste caso ainda vai a tempo de escrever um livro que fica em pé?

Dos 102 ou seja, os últimos 15 anos da minha vida vão ser dedicados exclusivamente a literatura. Agora vou dividindo com o cinema. Nos últimos 15 anos vou ser escritor a tempo absolutamente integral, não vou fazer mais cinema.

Voltando a sua ida à França que coincide com o surgimento do cinema novo. Gostava de perceber a sua relação com o cinema novo?

Fiquei na Europa de Março de 1952 até 1958 e depois voltei a França até com estadias maiores, mas naquele período em que fiquei na França havia dois grupos baseados em duas revistas; “Carhiers Du Cinéma” a revista “Positive”. Eu fiz amizade com este grupo do “Positive” que é uma espécie de uma revista da Direita e desse processo de interacção entre os dois grupos começa a surgir o movimento da “Nouvelle Vague”, mas é do movimento do “Carhiers” onde nascem os cineastas, casos do Truffaut, Éric Rohmer, Jean-Luc Godard, entre outros. São pontas de lança do “Carhiers” que viram cineastas, do “Positive” não me lembro de ninguém que se tenha tornado cineasta. Eu fazia parte do grupo “Positive”, mas sem escrever porque escrever francês era muito difícil. Na verdade tinha um contacto periférico com a “Nouvelle Vague”, não participei de presença física, nem de contacto directo com o pessoal da “Nouvelle Vague”, porque havia um pensamento do cinema anti industrial (grandes máquinas de produção e distribuição), defendiam mais um cinema do autor que era um ideal que estava na juventude, portanto o que mais tarde se consagrou como pensamento da “Nouvelle Vague” era uma coisa que estava já no ar da juventude do momento e do cinema que se pretendia profissional.

Mas é no Brasil onde se revela cineasta e é tido como um dos pais do cinema novo?

Há coisas que se criam e que você não consegue desmentir nunca. Há mentiras institucionalizadas e você passa décadas e décadas a escrever que não é, provam, mas aquilo continua. Eu me irrito muito quando falam de “Grift”: Nascimento da Nação – primeira longa-metragem da história do cinema. Pergunto, mas como é que é a primeira longa-metragem. Dou aulas de cinema, digo aos alunos que não é a primeira longa-metragem, mostro, provo, etc. Mas há sempre um que vai escrever a primeira longa-metragem é “Grift”. É mentira, mas não adianta, a mentira está institucionalizada. Não só o primeiro filme americano, é o segundo, o filme é de 1914, antes, o primeiro filme longa-metragem é de 1906 e antes do primeiro americano não tem ou dois, tem 17 longas-metragens. O primeiro filme longa-metragem é australiano. Há mentiras que se estabelecem dessa forma e de uma forma rígida.

Com isso quer dizer que a “história” do Brasil é uma mentira?

Não, não. Não é nenhuma mentira. Mentira é dizer que eu vinha com os conhecimentos da “Nouvelle Vague” e no Brasil havia movimento de cinema novo parecido com o do “Nouvelle Vague”. Não tinha nada parecido, nem em termos de estética, político, o cinema novo não tem nada de parecido com a “Nouvelle Vague”. Têm em termos de um cinema alegre, de produção baixa, porque é evidente que as situações eram completamente diferentes. No cinema francês havia uma indústria pesada, uma indústria acomodada. No Brasil não havia industria, infelizmente já tinha havido o fracasso do Vera Cruz que tentou montar uma indústria. Ali não havia que lutar por uma coisa institucionalizada, não havia nada, então era partir do nada. O que fizemos foi a busca de uma identidade nacional, procurar expressar melhor o Brasil que não fosse apenas o carnaval, o futebol e aquela mulata. Aliás até hoje é imagem do Brasil, é o país do futebol, do carnaval e da bela mulata. É verdade, mas não somente isso, nós tínhamos de procurar criticamente um cinema que buscasse outras dimensões, portanto uma produção política veiculada a uma perspectiva estética. Portanto, o cinema novo pretendia ser desmistificador, pretendia também ser um cinema de autor e o que era muito importante, talvez o que se dá menos importância no cinema novo era a busca, a certeza, a convicção de tratar temas novos, que não fossem “crichés”. Queríamos ter uma linguagem própria, uma linguagem cinematográfica própria e que não podíamos ir buscar nem na linguagem do cinema americano, francês ou no neo-realismo italiano, nem do expressionismo alemão. Tínhamos procurar uma linguagem porque os sistemas eram novos, com uma abordagem, um olhar diferente, então nós tínhamos que contar diferente.

Sem nenhuma indústria de cinematográfica, com grandes financiamentos, conseguiram criar o cinema novo?

Conseguimos e conseguimos de uma maneira muito estranha porque tivemos logo sucesso internacional com ajuda da crítica francesa que logo de imediato sentiu isso e deu uma grande repercussão, fez com que os nossos filmes tivessem muita visibilidade internacional. Uma coisa importante é que os primeiros filmes vão buscar quase que imediatamente o nordeste do Brasil caracterizado por fome e clivagem social. Uma feliz coincidência é que três cineastas, eu, o Golber e o Nelson fizemos três filmes sobre aquela temática, mas sob olhares completamente diferentes. Esses três filmes surgem num período de dois anos e com sinergia entre eles. De repente dão existência de um grande movimento de cinema. Entretanto, o cinema novo no Brasil durou pouco tempo. Estes filmes são de 1963 e 1964 e depois houve golpe de Estado e a ditadura fecha tudo.

Cinema está no caminho natural

Com essa toda vivência no cinema, que opinião têm em relação ao “boom” da televisão. O que me parece é que a “pequena” tela assumiu o mercado?

A indústria do cinema está num caminho que é natural, é verdade que a televisão invadiu, monopolizou a imagem em movimento e o cinema perdeu. O mal e ao mesmo tempo que a televisão faz, é se tornar num tumor de fixação. Vai pegando as coisas e deixar por cima. Não precisa de abordar certas temáticas e certas frustrações e isso até é melhor. O erro é quando o cineasta começa a copiar a televisão, porque a televisão tem um grande público, começa a tomar a forma de linguagem da televisão. A televisão tem uma vocação jornalística, uma vocação de informação fantástica, o cinema é mais um caminho da ficção, do imaginário. A televisão é imediata e o cinema tem uma vocação mais enquadrado no imaginário. É preciso também saber que a televisão não é uma forma de expressão estética, é um espaço de projecção, de distribuição e de exibição maior, então eu não acho que a televisão seja um mal para o cinema. A televisão é meio de exibição do cinema extraordinário, os mecanismos económicos é que fazem primeiro olhar para o cinema e depois para a televisão. Os mecanismos nacionais que a França resolveu muito bem: a televisão financia o cinema, os filmes que passam nas salas de cinema, um ou dois anos depois passam para televisão. Eu acho que são “primos-irmãos”, no momento são “primos-irmãos” brigado um com o outro. Portanto, eu acho que a televisão é um grande aliado do cinema.

Qual a razão da crise que se vive no cinema. Fala-se de redução de investimentos em quase todo mundo?

Nos Estados Unidos de América não, os orçamentos já estão em duzentos milhões de dólares. Há actores que recebem 20 milhões de dólares por um filme. O investimento no áudio visual é enorme. É avassalador. Nós estamos no nosso processo civilizatório e ficou convencionado que nesta fase pós industrial que as grandes fortunas vem da industria de comunicação. Os Microsoft, os bill gates. A informação, a imagem é que é a grande fonte económica. Então, o que acontece no cinema é que existe um grande monopólio que nunca será resolvido em termos de uma luta unicamente dentro do cinema. É um monopólio que só pode ser rompido pelas políticas nacionais de cada país de compreender a necessidade até para existir como sociedade e de país capaz de resolver os problemas económicos da sua própria nação e o cinema é, como todas as formas de arte, melhor forma de emancipação e libertação de um povo. A literatura, a pintura, a música, o cinema se não tiverem a imagem do seu povo, então esse é um povo escravizado.

Pegando nesta questão de emancipação de um povo, O Ruy Guerra fez parte do grupo que criou o cinema moçambicano logo no período da conquista da independência nacional, portanto participou da emancipação do povo moçambicano?

De facto, mas não é dar ao cinema a varinha mágica, dizer que o cinema vai fazer isto. O cinema é uma parte do processo de emancipação muito importante, porque é a forma de expressão artística que é do século da modernidade que surge no final do século XIX e que abarca todas as formas de expressão e por isso tem o poder de comunicação e tem um poder de transformação do indivíduo. A minha participação foi de desenvolver na área que melhor conheço, naquilo que sei fazer relativamente bem, contribuir para aquilo que achava que era importante para o processo revolucionário.

Samora Machel era um comunicador extraordinário

Numa entrevista que o Pedro Pimenta me concedeu há algum tempo, fez saber que a grande sorte que tiveram nessa altura da independência é que o país tinha um grande actor, o Presidente Samora Machel. Também é da mesma opinião?

Se eu não tivesse visto Samora Machel podia pensar que era um ser inventado. Samora Machel era um comunicador extraordinário. O povo saia transformado nos comícios, parece que tinha “dopping” de energia. Conseguiu fazer Fidel Castro cantar.

O que tem a dizer sobre os primeiros anos do cinema moçambicano?

Justamente vim para Moçambique para ver a independência. Cheguei uns dias antes da independência e trazia três câmaras fotográficas e não fotografei nenhuma cerimónia oficial, fotografei a alegria do povo. Só andava pelas ruas para fotografar o povo. Foi o espectáculo mais bonito que vive na minha vida. Fiz mais de três mil fotografias a preto-branco e a cores que depois ofereci a FRELIMO. Foi quando decidi voltar para aqui para trabalhar e tive apoio da FRELIMO para contribuir naquilo que melhor sei fazer: o cinema e participar da alegria do povo moçambicano. Participei do nascimento da imagem de uma nação. A primeira prioridade nesse processo foi a formação de técnicos para as diferentes áreas da indústria cinematográfica, mas também participei do processo de transformação de uma mentalidade que não é para fazer cinema de Hollywood, não era para copiar Hollywood. Formar técnicos com uma estética para fazer cinema moçambicano. Não era para fazer cinema brasileiro. Isto é, não era para copiar qualquer cinema, era para procurar a imagem da nação moçambicana. De referir que na altura não quase que existia em Moçambique, o único cinema que existia era de publicidade, portanto, era preciso formar e para isso trouxe quadros de Brasil que vieram de graças, mas motivados com o empreendimento que vinham desenvolver, mas acima de tudo porque sabiam que vinham participar de um movimento gratificante que é participar de um verdadeiro nascimento da imagem de uma nação. Outro aspecto que me interessava é que esse cinema chegasse ao povo para nele se identificar. Levei seis meses a desenhar um projecto de distribuição, inclusive o Pedro Pimenta me ajudou muito nesse projecto que era criar pontos de exibição nas comunidades, na época chamávamos aldeias comunais. Contamos com o arquitecto Forjaz na construção de umas paredes (telas) ao ar livre para as projecções, entretanto, este projecto de salas ao ar livre não vingou porque alguém disse que o Rui queria levar filmes de Tarzan para as comunidades.

Fracassado este projecto qual foi o passo seguinte?

Foi fazer cinema. Fiz o filme “Mueda” e fui fazendo documentários aqui e acolá, mas para mim não era o que me interessava fazer. Eu não vim aqui para fazer filmes meus, não porque não podia, mas achava naquele momento que o mais importante era criar uma estrutura de cinema, que é técnicos e dar essa ideia a esses técnicos da importância do cinema num processo de transformação e formação de uma nação. Evidentemente a médio prazo pensava que podia fazer um filme sobre Moçambique, portanto, o que me interessava era participar da criação de um cinema moçambicano.

Um pouco de Ruy Guerra

Ruy Alexandre Guerra Coelho Pereira (Maputo, antiga Lourenço Marques, 22 de Agosto de 1931) é um realizador de cinema, poeta, dramaturgo e professor nascido em Moçambique, então território português. Vive no Brasil desde 1958.

Estudou no Institut des hautes études cinématographiques (IDHEC) de Paris a partir de 1952. Até 1958, actuou como assistente de direcção, antes de se instalar no Brasil, onde dirigiu seu primeiro filme, Os cafajestes (1962).

Ingressando nas fileiras do Cinema Novo, em 1964 realizou seu melhor filme, Os fuzis, ao qual se seguiram obras notáveis como Tendres chasseurs (1969) e Os deuses e os mortos (1970).

A situação política brasileira durante a ditadura militar impôs-lhe uma pausa que terminaria em 1976 com A queda. Em 1980 regressou a Moçambique, onde rodou Mueda, Memória e Massacre, o primeiro longa-metragem do país. Ainda em Moçambique, realizou diversos curtas e contribuiu para a criação do Instituto Nacional do Cinema. Viveu e trabalhou também em Cuba por alguns períodos.

Em 1982 rodou no México, Erêndira, baseado em A incrível e triste história da Cândida Erêndira e sua avó desalmada, de Gabriel García Márquez. Posteriormente dirigiu: o musical Ópera do malandro (1985), baseado em peça de Chico Buarque; Kuarup (1989), baseado no livro Quarup, de António Callado; e o telefilme Fábula de la bella palomera, também baseado em Gabriel García Márquez.

Foi casado com a actriz Leila Diniz com quem teve uma filha, Janaína Diniz Guerra, nascida em 1971. Foi também casado com a actriz Cláudia Ohana com quem teve uma filha, Dandara Guerra, nascida em 1983.

Ruy Guerra tem também um importante trabalho como letrista de canções compostas em parceria com Chico Buarque, Carlos Lira, Edu Lobo, Francis Hime e Sergio Ricardo.

Filmografia

1954: Quand le soleil dort “Quando o sol dorme” (Director e roteirista)

1957: S.O.S. Noronha (Actor)

1962: Os cafajestes (Director e roteirista)

1962: Os mendigos (Montador e actor)

1964: Os fuzis (Director e roteirista)

1968: Balada de página três (Roteirista)

1968: Benito Cereno (Actor)

1969: Ternos caçadores (Director e roteirista)

1970: Os deuses e os mortos (Director e roteirista)

1970: O senhor do tempo (Actor)

1972: Os sóis da ilha de Páscoa. (Actor)

1972: Aguirre, der Zorn Gottes (Actor)

1975: As aventuras de um detective português (Roteirista)

1976: A queda (Director, roteirista, compositor e actor)

1980: Mueda, memória e massacre (Director e director de fotografia)

1981: Histoires extraordinaires: la lettre volée (Director e roteirista)

1983: Eréndira (Director)

1986: Ópera do malandro (Director, roteirista e produtor)

1988: Fábula de la bella Palomera (Director, roteirista e produtor)

1989: Kuarup (Director, roteirista e produtor).

1992: Me alquilo para soñar – telessérie (Director e roteirista).

1997: Posta restante (Roteirista)

2000: Monsanto –TV (Director).

2000: Estorvo (Director, roteirista e produtor)

2004: Portugal S.A. (Director)

2004: O veneno da madrugada (Director e roteirista)

2005: Casa de areia (Actor)

Por João Fuma