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sexta-feira, 3 de outubro de 2008

O país está a arder: o caso da Namaacha


Texto/Fotos: Edmundo Galiza Matos
A prática das queimadas das matas, seja para fins agrícolas ou para a caça de animais de pequeno porte, sempre foi usada pelas populações camponesas como meio para a obtenção da sua alimentação. Geralmente, elas acontecem no período intermédio entre a época seca e a da chuva. E de forma controlada através da utilização dos chamados quebra-fogos e em dias sem vento para evitar a sua propagação para além dos limites.
Durante vários anos, as autoridades administrativas e agrícolas do país tinham como tarefa, entre outras, o controle da prática, mantendo sempre os camponeses informados dos limites entre os benefícios do fogo sobre a vegetação e a sua nocividade quando usado para além do necessário.
Não sei muito bem porque razão esta colaboração perdeu a sua força, a verdade porém é que, não só os camponeses já não respeitam as regras, como, ao que tudo indica, “infiltrou-se” entre eles um elemento estranho: individuos que, não sei se por “atracção” pelas labaredas, atiçam fogo à vegetação seca, escolhendo as noites ventosas para a sua actividade criminosa.
Os prejuízos são por demais conhecidos mas terão sido demasiado evidentes quando em agosto/setembro deste ano as queimadas vitimaram mortalmente mais de duas dezenas de pessoas e destruiram casas e celeiros de camponeses no centro do país, com particular incidência na província de Manica.
No início desta década, quando por opção escolhi a vila fronteiriça da Namaacha para construir o meu “Sítio”, deliciavam-me com a vegetação verdejante que se observava ao longo da Estrada Nacional N. 2 entre a cidade de Maputo e a fronteira da Swazilândia. Recordo-me que não raras vezes comprava dos camponeses, perfilados na berma da estrada, maçaroca e amendoim fresco quase todo o ano e amigos meus, aos fins de semana, excursionavam por aquela região para comprarem o Vondo, uma espécie de ratazana cuja carne, ao que dizem, tem o mesmo gosto a do porco.
A uma determinada altura este ambiente começa a desvanecer-se por culpa das queimadas realizadas irracionalmente pelos próprios camponeses, o que me levou a lançar um “grito de alerta” dirigido ao então Ministro da Agricultura, Hélder Muteia. Lembro-me de, numa noite “ensaguentada” por chamas gigantes, a um/dois quilometros de Mafuiane, ter ligado para o Ministro Muteia informando-o do “infernal” mas espectácular espectáculo que então se deparava, rogando que chamasse a atenção dos responsáveis pela fauna e flora para aquele desastre ecológico. “Namaacha está a arder”, gritei-lhe do telefone móvel. E não estava a exagerar.
Hoje, mais ou menos seis anos depois deste episódio, não só desapareceu a maçaroca e o amendoim e o Vondo, como as queimadas, por inoperância das autoridades, agudizaram-se, sem que alguém mexe uma palha para evitar mais esta calamidade - porque disso se trata – como os seus autores, mesmo perfeitamente identificados, continuam a cometer este crime contra a natureza.
As imagens falam por si. Foram registadas um pouco antes de Mandevo, no chamado Km 60, uma zona onde, anos atrás, diz-se, foi um excelente habitat de gazelas, coelhos, galinhas do mato, vondo e até cabritos do mato.
É caso para nos indagarmo-nos: É este legado de um país desertificado que queremos deixar para as gerações vindouras?
Acredito que não. Mas é preciso agir, sob pena de, quando sentirmos na pele a queimadura das acções criminosas praticadas irracionalmente por todos sem excepção, acordarmos para um desastre sem a mínima possibilidade de mitigar.

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